É sob o manto da alegria do Senhor que podemos reafirmar o sentido de ser santo, mesmo num mundo onde padrões e estilos nos cumulam de fardos e de suposições de que ser santo é ser triste, relacionando a doação da vida à Santa Vontade de Deus com um jeito acabrunhado de viver.
A Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate do Papa Francisco, sobre o chamado à santidade no mundo atual, deixa bem claro que, ao longo de toda história da salvação, a alegria e a permanência nesse estado de satisfação interior estão intricadamente ligadas ao fato de encontrar-se com o Senhor e ali conhecê-lo e revelá-lo ao mundo, ao mundo muitas vezes entristecido pela falta de uma alegria verdadeira.
A Palavra do Senhor está repleta de testemunhos de profetas, salmistas, apóstolos, discípulos, tantos homens e mulheres que, por encontrar o Senhor, exultaram de alegria e nesse estado, viveram tanto nos tempos difíceis como nos dias mais tranquilos de suas vidas.
O Santo Padre continua quando afirma no parágrafo 125 da Exortação:
Sobretudo, o motivo da alegria da santidade nesse mundo atual, é saber-se amado e querido por Deus. É saber que estamos inseridos num plano perene e não efêmero, legítimo e não relativo. Esse plano de amor é a realização das nossas vidas. Como dito anteriormente, são muitos fardos impostos, são dores diárias que chegam a apagar a luz do sentido da vida em nossos olhos, e é justamente aí que percebemos que a luz de Deus nunca se apaga. É com essa consciência, com essa abertura ao sobrenatural do Espírito Santo que entenderemos que a alegria do Senhor é a nossa força.
A expressão “mundo atual” tem um sentido de inconstância e até mesmo de instabilidade, visto que, em cada momento influenciadores que estão nas mídias globalizadas se expressam sobre suas maneiras de ver e agir diante das situações. Por que não santos e pessoas que conhecem a Deus também serem influenciadores? Não de um estilo de alegria passageira, mas influenciar o mundo triste por causa do pecado com as alegrias do Senhor que os alcançaram. Se tantas pessoas se empenharam tanto em mudar o mundo, segundo o que elas mesmas acreditavam e que, de certa forma, até conseguiram, por que não as pessoas que conhecem a alegria que vem de Deus, motivar a mudar o mundo retirando-o do estado de tristeza e de pecado?
Nessa mesma Exortação, o Papa nos alerta sobre os perigos do gnosticismo e pelagianismo atuais, isto é, sobre o fato de que pessoas são medidas segundo a quantidade de dados e conhecimentos acumulados e não segundo a medida de sua caridade, do seu amor a Deus e ao próximo. Centrando a sua confiabilidade no seu próprio intelecto – inclusive sobre o que conhece de Deus – e não exatamente na experiência de conhecer a Deus e deixar-se ser guiado por Ele, conhecendo a sua Vontade e não moldando-a a si mesmo. Num segundo caso, esse pelagianismo ou semipelagianismo que, mesmo tendo o conhecimento de Deus e dEle fale, centra sua confiança verdadeira em suas próprias capacidades, acreditando ser até melhor que outros pelas ações altruístas e moralmente corretas e até mesmo irrefutáveis (o politicamente correto tão criticado ultimamente). Em tudo isso que, mesmo com boa aparência e reputação, há o risco de não conhecer a verdadeira alegria do Senhor.
Os santos revelam pra nós a força de se ter um bom humor. A graça de ser amigo de Deus mesmo em momentos tão sombrios garante a paz e a alegria interior. “O mau humor não é sinal de santidade”, daí a necessidade de lançar fora a tristeza do coração, uma vez que o Senhor muito se dedica em nos dar tanto, muitos dons e graças. A tristeza seria nesse caso uma forma de ingratidão, nos fechando à percepção da bondade de Deus.
Há uma grande diferença entre a alegria do Senhor e as alegrias dos tempos atuais. A alegria como dom de Deus não é consumista e nem tampouco individualista, pois essas atravancam os corações e surgem de forma passageira e seus prazeres são ocasionais. A alegria que vem de Deus é, antes de tudo, uma alegria de comunhão, que, conforme diz nos Atos dos Apóstolos (20, 35), se compraz muito mais em dar do que em receber. A alegria, o bom humor, a felicidade cristã se realiza na comunhão. Assim, somos felizes e alegres quando fazemos outros felizes e alegres.
Dessa forma, diante do desafio de viver no mundo atual, em que tudo é passageiro e inconstante, somos chamados a ser santos e, nessa perspectiva, sermos alegres, bem humorados e transmitir a esse mundo que a alegria que vem de Deus é o que nos dá a força para ultrapassar as barreiras impostas diariamente nesse nosso tempo de viver. A alegria da comunhão se renova sempre, nos completa e gera outros alegres irmãos para santificar esse mundo.